Ser livre...

   A liberdade como fonte de felicidade e plenitude duradoura tem uma ligação estreita com o altruísmo. De que vale a liberdade que traga benefícios apenas para nós mesmos? No entanto, para respeitar o direito das pessoas de evitar o sofrimento, é preciso estarmos, nós próprios, liberados dos grilhões do egoísmo. Para ajudar melhor os outros, devemos começar por mudar a nós mesmos. 
   Ser livre quer dizer também ser capaz de seguir um caminho de transformação interior. Para este fim, é preciso vencer não só a adversidade exterior, como também, e mais ainda, os nossos inimigos interiores: a preguiça, a dispersão mental e todos os hábitos que nos distraem ou fazem com que adiemos a nossa prática espiritual.
   Como vimos, os prazeres, de inicio atraentes, quase sempre se transformam no seu oposto. O esforço exigido pela jornada espiritual e pelo processo de libertar-se do sofrimento segue uma progressão inversa. Às vezes árduo no começo, ele gradualmente se torna mais fácil e inspirador, e pouco a pouco traz um sentimento de realização que não pode ser substituído por nada. O seu aspecto austero dá lugar a uma satisfação profunda, que os estados de dependência ou de saciedade não podem alcançar. Sukha constitui um tipo de armadura tão flexível quanto invulnerável. Conforme um sábio tibetano: "É fácil para um pássaro ferir um cavalo que já tem as costas machucadas, assim como é fácil para as circunstâncias ferirem alguém que tem medo, mas elas não têm nenhum poder contra as naturezas estáveis." Tal realização merece o nome de liberdade.

Matthieu Ricard em "Felicidade, a prática do bem-estar".

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